Academia Galega apresenta três novas publicações
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A Academia Galega da Língua Portuguesa apresenta 2 novos números da Coleção Clássicos da Galiza: Folhas Novas e Proel e o Galo, e A música de seis poemas universais de Ernesto Guerra da Cal. O lançamento das três novidades editoriais terá lugar o dia 24 de julho às 17.45 em Santiago de Compostela, no Festigal (Campus Universitário).
A Academia Galega da Língua Portuguesa apresenta 2 novos números da Coleção Clássicos da Galiza: Folhas Novas e Proel e o Galo, e A música de seis poemas universais de Ernesto Guerra da Cal. O lançamento das três novidades editoriais terá lugar o dia 24 de julho às 17.45 em Santiago de Compostela, no Festigal (Campus Universitário).
A Música de seis poemas universais de Ernesto Guerra da Cal é uma edição comentada de 6 partituras, inéditas ou de acesso difícil, elaboradas por diversos autores sobre poemas de Guerra da Cal, cuja impressão foi encomendada à editora Dos Acordes. A responsabilidade da edição correspondeu a José Luís do Pico, Isabel Rei e Joám Trilho. Editora Dos Acordes.
Folhas Novas, de Rosalia Castro, em edição do académico Higino Martins, é o número 4 da coleção, que dá continuidade ao primeiro volume, Cantares Galegos, ao cuidado do mesmo académico especialista na obra rosaliana.
Proel e o Galo, de Amado L. Carvalho, faz o número 5 da série dos clássicos. O trabalho fundamental de adaptação dos textos literários de Amado Carvalho foi realizado por Isabel Rei. Ernesto Vázquez Sousa redigiu a introdução histórico-biográfica, e Carlos Durão e Fernando Corredoira reviram todo o conjunto.
A Academia Galega da Língua Portuguesa (AGLP) prossegue a sua coleção de clássicos galegos, editada em colaboração com Edições da Galiza, dentro da sua tarefa fundamental de recolocar a Galiza como membro pleno da Lusofonia.
Amado Carvalho é uma figura que, apesar da sua prematura morte, deixou na história da Literatura Galega uma poesia de feição original e de longo influxo. Rosalia Castro, de que a Academia já editou Cantares Galegos, também sob a responsabilidade e Higino Martins, é considerada a Escritora Nacional da Galiza.
Sobre a Coleção
A coleção de clássicos galegos pretende que as obras literárias dos escritores galegos que criaram a sua produção na variante galega da língua portuguesa possam ser lidas pelos lusófonos de qualquer lugar (começando naturalmente pelos próprios galegos) sem estorvos artificiosos, carentes de importância linguística ou literária (como pode ser um sistema ortográfico alheio).
Apresenta escritores galegos que criaram a sua obra em língua portuguesa da Galiza, adaptando esses textos especialmente nos campos ortográfico e morfológico para uma versão linguística que –sem por isso deixar de manter-se fiel à substância idiomática mais autêntica dos textos originais– apareça em sintonia com a língua portuguesa comum, isto é, sem variantes gráficas ou morfológicas carentes de significado literário, por terem sido provocadas pela situação em que a língua da Galiza se vem desenvolvendo historicamente desde há cinco séculos.
A colonização linguístico-cultural castelhana que o país vem sofrendo desde os fins da Idade Média determinou negativamente, como é natural, o desenvolvimento da produção literária na língua portuguesa da Galiza durante toda a época moderna e contemporânea. Nos escritores galegos o uso literário da sua língua nativa (relegada dentro da Galiza a um emprego exclusivamente oral) derivava de um compromisso moral com a cultura do seu país e das suas gentes. Mas nesse generoso labor encontravam muitas dificuldades que mal podiam superar: achavam-se isolados socialmente do resto do mundo literário lusófono, e desconheciam não só uma norma padrão de uso ortográfico ou morfológico mas também exemplos de obras literárias do passado ou do presente que, realizadas num ambiente cultural de normalidade linguística, pudessem servir-lhes de modelo literário. Nessa situação é bem compreensível, e plenamente desculpável, que as produções literárias galegas fossem redigidas na ortografia castelhana (pois era a única que conheciam tanto os autores como os mais próximos leitores) e com uma morfologia oscilante ou indisciplinada. Recuperar para a língua portuguesa toda essa produção exige corrigir esses aspetos, provocados pela anormalidade histórica em que os textos nasceram.
A poesia de Amado Carvalho
A poesia de Amado Carvalho (Ponte Vedra 1901-1927) apresenta um tom original, que, pelo seu enlevo alcançou imediatamente grande êxito popular e teve numerosos seguidores na Literatura galega ao longo da primeira metade do século XX.
É, antes de mais, uma poesia paisagística: descreve a paisagem galega. Mas com tons de clara originalidade: a característica mais visível da poesia de Amado Carvalho consiste na abundância de imagens de natureza prosopopeica; isto é: a natureza inanimada (nomeadamente a paisagem rural galega) é apresentada sob fictio personae, com traços humanos: as coisas e, em menor medida, os animais domésticos são apresentados como se fossem seres humanos, que agem e se relacionam entre si como o podem fazer as pessoas. A paisagem aldeã fica, pois, humanizada poeticamente.
Na verdade, esse género de metáforas está presente, talvez desde sempre, em muitos poetas; o que infunde um caráter especial à poesia de Amado Carvalho é o papel que na estruturação dos seus poemas assume esse imaginismo prosopopeico.
Também se deve ressaltar a preferência de Amado Carvalho pelas imagens de natureza pictórica: os seus poemas são como um quadro, de inspiração ingénua, como de um pintor primitivo ou naif, onde prevalecem as cores vivas e chamativas, conforme o gosto popular.
Tem-se denominado de diversos modos esta poesia metaforicamente descritiva: “neorromânica” (pelo seu carácter de primitivismo popular), “imaginista” (pelo papel desenvolvido pelas metáforas na estruturação dos poemas), “hilozoísta” (por ser uma animação [-zoísta) da natureza material [hilo-]).
O êxito popular da poesia de Amado Carvalho viu-se propiciado também pela sua singeleza formal. São poemas de compreensão fácil e de leitura agradável mesmo para gente pouco habituada ao uso literário. E é que, como acontecia com as cantigas de amigo trovadorescas, no aspeto formal a poesia de Amado apresenta uma singeleza de estranho encanto. Emprega versos curtos, de forma literária simples, geralmente com rima assonante, com estrutura similar à das cantigas populares tradicionais. Também no terreno linguístico predomina a singeleza: nomeadamente a estrutura sintática é clara e transparente, sem complicações.
Prólogo a Folhas Novas
O professor Higino Martins, adaptador de Folhas Novas, incluiu o seguinte prólogo na edição:
Editar os textos galegos de Rosalia de um jeito linguisticamente digno é condição prévia a qualquer pretensão de normalidade na cultura galega. Ela, a única figura universal da letras modernas galegas, ao publicar os Cantares Galegos, abrigava o propósito de fazer acordar as energias do povo desta terra.
Editados os Cantares segundo o Acordo Ortográfico do ano '90, fica o repto decerto maior de fazê-lo com as Folhas Novas. É um livro mais difícil por várias razões: o tom escuro, o heterogéneo dos assuntos, mas sobretudo por estar mais distante da lira popular e das suas andadeiras linguísticas, que dão a segurança de sintagmas tradicionais para paliar as eivas que os séculos inseriram no idioma.
Nos Cantares pouco custou emendar as escassas fendas que a mesma Rosalia percebia na sua fala local. Quase tudo foi uma questão de léxico. Mas ao se pôr a fazer poesia na língua do país, nas Folhas, sem ajuda da tradição lírica popular, viu-se obrigada a recorrer à técnica versificatória aprendida na escola castelhana, na que polira a língua familiar, a castelhana da Galiza, em que os setores dos bons recursos económicos viviam a mor parte da sua vida. Para dizê-lo mais breve, a língua das Folhas foi interferida pela ortoépia castelhana. A língua sofre sinéreses impossíveis em casos em que o português pede hiatos.
Os escrúpulos nesta ocasião foram maiores, mas o caso não admite delongas. Lembro o horror de professores de outras gerações ao insinuar a possibilidade de normalizar um texto sagrado, sentida como nefanda transgressão. Ora, se alguém quiser qualificar tal atividade como tradução, terá a liberdade de fazê-lo, e nós já temos a de tentá-lo com toda a alegria e também com o mais lídimo e verdadeiro dos amores a Rosalia.
(Higino Martins)