António Gil Hernández: "As Academias lusófonas nom podem entender-se com a RAG"

António Gil Hernández

"É como se a Real Academia Espanhola
se entendesse com umha academia de spanglish"

Eduardo Maragoto - António Gil Hernández é o presidente da Comissão de Lexicologia e Lexicografia da Academia Galega da Língua Portuguesa (AGLP), um projecto de criaçom recente que aglutina os defensores da adopçom, sem demoras nem normas transitórias, do Acordo Ortográfico de 1990, que previsivelmente será adoptado polo conjunto dos países lusófonos nos próximos anos

É também um dos principais referentes intelectuais dessa corrente do reintegracionismo, tendo publicado nomeadamente trabalhos de carácter sociolingüístico.

Em Abril, a AGLP apresentou à Academia Brasileira de Letras e à Academia das Ciências de Lisboa o “Léxico da Galiza para ser integrado no Vocabulário Ortográfico Comum da Língua Portuguesa”, que inclui perto de 700 palavras passíveis de ser incluídas em dicionários portugueses e brasileiros. O trato recebido pola Academia galega por parte das homólogasluso-brasileiras surpreendeu muitas pessoas adversárias, e até partidárias, do movimento reintegracionista, que nom estavam à espera de tamanho reconhecimento a um movimento ainda mui afastado do poder institucional. 

Que possibilidades reais existem de estas palavras virem a fazer parte dos principais dicionários portugueses?

Se estás a referir-te aos dicionários de empresas editoras, parece que algumhas empresas estám interessadas... Quanto ao Vocabulário e ao Dicionário 'oficiais', em grande medida fôrom eles a dizer-nos que propugéssemos por volta de 600 palavras galegas.

Qual foi o método seguido para a escolha das palavras galegas propostas? Lendo-as, dá a sensaçom de muitas nom serem de uso geral: dialectalismos e até castelhanismos...

Os critérios fôrom fazer propostas suficientemente estritas como amostra do que poderíamos introduzir à espera de que nos digam ou pactuemos os critérios. Começamos polo Vocabulário (neste som menos as palavras propostas). O Dicionário será diferente: sem tratar-se de um tesouro lexical, tem que dar umha visom da língua extensa e útil. É um instrumento que se dá para quem quiger ler um texto, literário ou de outra ordem, para que poda recorrer a um dicionário caso nom conheça umha palavra. Por isso, na parte do dicionário fomos relativamente generosos. O critério que se usou foi que essas palavras nom existissem no dicionário da Academia das Ciências de Lisboa, embora muitas delas estejam no Houaiss (Brasil) e noutros portugueses, às vezes com referência à sua condiçom regional do Minho.

Chama a atençom que nom esteja a palavra 'reintegracionismo' nem essa acepçom para 'lusismo'.

Nom, em tal caso, no Dicionário, quando chegasse o momento, poderia incluir-se. Isto é umha proposta nom definitiva. Esperamos as observaçons de professores que receberam o texto, que é um rascunho, umha amostra que se apresentou quando foi apresentado o Vocabulário brasileiro.

Em que medida se trata de relaçons entre academias em pé de igualdade?

Participamos em duas sessons. Na primeira, fomos recebidos na mesma sala em que tiveram lugar as discussons sobre o Acordo Ortográfico (1990) em Lisboa. Estávamos 4 académicos galegos e 5 portugueses; depois fomos convidados a um jantar na própria Academia que, ainda que descontraído, seguiu o protocolo correspondente. Quanto à segunda sessom, a solene, na mesa estavam os três presidentes das Academias. À partida, nem nós próprios contávamos com isso, mas foi exigido pola parte portuguesa e brasileira. Em que condiçom? Entendemos que em pé de igualdade, apesar da situaçom particular da Galiza. Tenha-se em conta que mesmo com umha situaçom normalizada, a Galiza nom pode ombrear-se com o Brasil. Há outras diferenças interessantes de salientar e que nos aproximam do Brasil. É o facto de a Academia Brasileira das Letras ser, como a AGLP, 'privada'. Nom é organismo do Estado, como a Academia das Ciências de Lisboa, embora seja referência assumida polo Governo federal.

Xosé Ramón Barreiro dixo a este jornal que se tinham posto em contacto com Lisboa para lhes fazer ver que a RAG era a única “representante da Galiza”. Nom lhe figérom caso?

Nom sei se lhe figérom caso e nem sequer sei se de verdade se dirigiu à Assembleia da República Portuguesa. O que é verdade é que com quem entendem que devem entender-se é com os reintegracionistas e concretamente com o órgao equivalente ao que eles tenhem. Nom faria sentido que se entendessem com umha academia que di que o galego e o português som línguas diferentes. É como se a Real Academia Espanhola se entendesse com umha academia de spanglish.

Até quando vai tolerar Portugal este relacionamento. Ou será que o rumor do suposto medo português a Espanha nom tinha fundamento?

Isto daria para umha conferência. Polo que observo, nas reunions realizadas houvo umha sançom positiva tanto de Portugal e do Brasil como de Espanha. Neste caso, interessa salientar que há umha entidade galega, mais ou menos do mesmo nível institucional que a portuguesa e a brasileira, reconhecida por estas instituiçons, e da qual fôrom testemunhas qualificadas um representante do ministro que está a levar a introduçom do Acordo [o ministro da Cultura português] e o segundo da Embaixada espanhola. Ele, que estivo presente na reuniom, pudo comprovar de que se tratava.

As relaçons da Academia Galega da Língua Portuguesa com a parte nacionalista do governo bipartido pareciam boas; e agora, virám mais dificuldades?

O novo governo nom ajudará, mas nom penso que poda pôr dificuldades; enquanto as cousas estiverem mais assentes, temos pensado falar com o presidente da Junta. De qualquer modo, o Governo nom pode interferir nas actividades lícitas dos cidadaos e, por outro lado, nom dependemos dos orçamentos estatais ou autonómicos.O Governo de Madrid, que é o que tem as competências relacionadas com os negócios estrangeiros está informado de todo o que fomos fazendo, porque a Embaixada espanhola em Lisboa foi informada de cada reuniom por nós mesmos; nom se pode dizer que andássemos a esconder nada.

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Gil Hernández, António (1941)

António Gil Hernández

É membro da Comissão de Lexicologia e Lexicografia, e diretor do Boletim da AGLP no Conselho de Redação e Administração da revista.

Nascido em Valhadolid (“Comunidad de Castilla y León” no “Reino de España”), vive na Galiza desde 1969. Licenciado em “Filosofía y Letras”, secção Românicas, subsecção Espanhol, pela Universidade de Santiago de Compostela, exerceu a docência no Colégio Universitário da Crunha, dependente então da Universidade de Compostela, como professor de Linguística Geral e Crítica Literária. Também exerceu a docência no IES "Salvador de Madariaga", na Crunha, desde o ano 1978 até ao 2010, em que se reformou como funcionário do reino da Espanha. Desde novembro desse ano continua a gozar do estado de "classe passiva" levando adiante algumas atividades, relativamente humanas.

Cofundou a Associaçom Galega da Língua em 1981, de que foi secretário. Entre outras entidades, participou ou participa na Associação Sócio-Pedagógica Galega, nas Irmandades da Fala da Galiza e Portugal, na Associação de Amizade Galiza-Portugal, assim como na Sociedad Española de Linguística.

Começou a colaborar nos Colóquios da Lusofonia em 2006, «Do Reino da Galiza até aos nossos dias: a língua portuguesa na Galiza», com a comunicação intitulada «Aos 100 anos da Real Academia Gallega de la Coruna. Mais uma análise de discurso.» Nesse colóquio puseram-se as bases para a constituição da AGLP.

Entre as suas publicações destacam-se: Que galego na escola? (1984), coletivo, e Silêncio ergueito (1996), ambos nas Eds. do Castro. No primeiro, expõe as denominadas «Teses reintegracionistas” ou “integracionistas” das falas galegas à língua comum, portuguesa. No segundo compila artigos jornalísticos de 1979 a 1982.

Em 2005, a Associação de Amizade Galiza-Portugal publica-lhe Temas de Linguística Política, seguidos dum avanço de Temas de Política Linguística.

Leves reflexões sobre política nacional “española”. É editor da Obra selecta (poesia e ensaio) de João Vicente Biqueira (1998), como núms, 43-46 de Cadernos do Povo. Revista Internacional da Lusofonia.

Artigos seus foram publicados nas revistas Agália, O Ensino, Nós, entre outras.

Participou nos Congressos organizados pela AGAL e pelas IFG-P. Também é autor de textos literários, como Baralha de sonhos (1985), Luzes e espírito (1990) e, em volume coletivo, Só para falar de amor (1991), publicados em suporte papel; como livros-e, no portal brasileiro Recanto das Letras, estão Ela e Ele (2009), Rimas a Amarílis (2008) Silveira Lírica (I) (2008), Ut Pictura... Poemas a Cármen Nóvoa (2008), Tractatus de Euphemica Dictione (2008) “conversa lírica com Cristina de Mello”, Do Amor de Tudo Quanto é Livre (2008), versão corrigida da Só para Falar de Amor, Luzes e Espírito (2008), versão corrigida da edição em livro, Contos Nada Exemplares (2008), antologia dos publicados com esse título no PGL.

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Duas entrevistas ao professor António Gil Hernández


Para acabar este ciclo de notícias sobre o Colóquio Homenagem a Ernesto Guerra da Cal e o III Seminário de Lexicologia organizado pela AGLP, apresenta-se o áudio da entrevista realizada ao professor António Gil Hernández em 11 de outubro de 2011 na Fundação CaixaGalicia, e também o vídeo de uma segunda entrevista realizada em 7 de janeiro do presente ano, no fim da assembleia da AGLP, no Centro Galego de Arte Contemporânea de Santiago de Compostela.

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