Info Atualidade

Evanildo Bechara promove texto a favor do Acordo

  • Escrito por: PGL
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 Professor Evanildo Bechara

Foi apresentado durante o 3º Encontro Açoriano da Lusofonia

PGL Portugal - Na sequência do recentemente realizado 3º Encontro Açoriano da Lusofonia (8-11 Maio) na Lagoa, Ilha de São Miguel, o professor Evanildo Bechara (tesoureiro da Academia Brasileira de Letras), apresentou um manifesto a favor do Acordo em que também realiza umas interessantes considerações em torno do manifesto-petição contrário ao mesmo.

Bechara é autor, entre outros textos relevantes, da Moderna Gramática Portuguesa, a mais utilizada no Brasil. Já vai pela 37ª edição. O manifesto promovido por ele é também assinado pelo académico João Malaca Casteleiro e outros 34 professores participantes no encontro açoriano.

Para já, e mesmo no dia em que a Assembleia da República portuguesa debate o texto do Acordo, no PGL achamos de interesse divulgar o manifesto Bechara:

Considerações em torno do MANIFESTO-PETIÇÃO dirigido ao senhor Presidente da República e aos Membros da Assembléia da República contra o Novo Acordo Ortográfico de 1990

O noticiário da imprensa portuguesa veicula as razões que levaram numerosas personalidades da cultura do país a assinar o Manifesto-Petição contra o Acordo Ortográfico de 1990, a ser examinado pela Assembléia da República, provavelmente no dia 15 de Maio de 2008, pelo qual se propõe a unificação ortográfica nos países de expressão oficial de Língua Portuguesa.

É incontestável o peso e o prestígio, justamente alcançados, dos signatários do Manifesto-Petição; o que vamos tentar mostrar é o peso e autenticidade das críticas feitas ao texto do Acordo em discussão segundo as declarações, que se dizem extraídas do referido Manifesto-Petição e divulgadas pela imprensa. O primeiro conjunto de críticas atribuídas à proposta de reforma ortográfica diz que ela é “mal concebida” e “desconchavada”.

Ora quem faz a história crítica das diversas propostas da reforma ortográfica em Portugal percebe claramente que elas construíram um macrotexto a partir do estudo inicial de Gonçalves Viana e Vasconcelos Abreu, entre 1885 e 1886, passando pelo livro seminal ortografia Nacional, de Gonçalves Viana, saído em 1904, referendada pelo governo português, consoante proposta assinada por um grupo dos mais conceituados filólogos da época, onde luziam os nomes de J. Leite de Vasconcelos, Gonçalves Viana, Carolina Michaëlllis de Vasconcelos, A. G. Ribeiro de Vasconcelos, entre outros.

De então a esta parte, as bases das reformas ortográficas que se sucederam, independentemente ou em conjunto, em Portugal e no Brasil, vieram tecendo um texto matriz ora reduzido ora ampliado em aspectos necessários, mas na essência, as linhas mestras garantiam o ideário e a concepção dos ortógrafos que, a partir de 1911, pensaram o problema da reforma ortográfica no trilho da ciência lingüístico-filológica.

As bases que orientaram a proposta de 1943 e, principalmente, de 1945 são filhas diletas dessa tradição do macrotexto; nesta última, ressalte-se a erudição e a competência do saudoso ortógrafo Rebelo Gonçalves.

O Acordo Ortográfico de 1986, melhorado na proposta de 1990, graças às críticas e sugestões recebidas, pertencem inexoravelmente, a esta tradição cultural, e, portanto, custa atribuir-lhes os qualificativos de “mal concebido” e “desconchavados”. Aceitá-los, sem um exame aturado como está a exigir um Manifesto-Petição da natureza e propósito dirigido à Assembléia da República, representa no mínimo, desmerecer o trabalho dos que, em Portugal, melhor fizeram para o estabelecimento e progresso das ciências da linguagem.

Pelas mesmas razões até aqui exaradas, não se há de aceitar a crítica, segundo a qual a reforma peca por apresentar-se “sem critério de rigor”. Pode dizer-se, em sã consciência de uma reforma que não se caracteriza pelo critério de rigor, quando essa mesma reforma, publicado o texto de 1986, acolhe as críticas e sugestões que lhe chegaram ao conhecimento, e as incorpora, quando possíveis, à nova redação de 1990?

Diz também o Manifesto-Petição que a proposta é “perniciosa, e de custos financeiros não calculados”. Ora, a crítica não se aplica, em rigor, só à reforma em discussão; mas a toda a série de reformas que, se propuseram – e não foram poucas! – desde 1911 até aos nossos dias. Um inteligente e razoável prazo fixado pelas autoridades e editoras tem minorado os custos financeiros de quem se considera prejudicado.

Toda a motivação que tem justificado as sucessivas reformas ortográficas insiste em que elas pretendem garantir a defesa da língua e facilitar o estudo e ensino do idioma. Por isso, também parece não caber à presente proposta a declaração exarada no Manifesto-Petição de que ela é, “nas suas prescrições, atentatória da defesa da língua”.

Só num ponto concordamos, em parte, com os termos do Manifesto-Petição quando declara que o Acordo não tem condições para servir de base a uma proposta normativa, contendo imprecisões, erros e ambigüidades”. Os doutos lingüistas da Universidade de Lisboa e professores de ambas as margens do Atlântico e especialistas das línguas africanas já apontaram falhas e sugestões. Mas isso tem ocorrido com todas as propostas de reforma, e elas são aceitas e adotadas mesmo assim, com promessas de melhorias no futuro. A mesma reforma de 1911, que tem sido considerada a mais feliz de todas, tão logo foi oficialmente aprovada, mereceu pareceres de elogio, mas também de receio de boa solução para alguns problemas da rica fonologia das vogais e da flexão verbal. E essas partiam do alto saber de D. Carolina Michaëlllis, signatária do texto da reforma.

As falhas que se podem apontar no Acordo Ortográfico, facilmente sanáveis, não devem impedir que a língua escrita portuguesa perca a oportunidade de se inscrever no rol daquelas que conseguiram unificação no seu sistema de grafar as palavras, numa demonstração de consciência da política do idioma e de maturidade na defesa, difusão e ilustração da língua da lusofonia.

 Fonte original:

Umha experiência inesquecível

  • Escrito por: Alexandre Banhos
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Alexandre Banhos
Alexandre Banhos

Para Lisboa

Na viagem para Lisboa o carro Daewoo dera-nos alguns problemas. Numha das paragens houvo que empurrá-lo para que o motor acabasse puxando dele. Ao chegar a Lisboa, parámos diante do nosso hotel, o American Diamonds (em lugar onde era proibido deixar o carro) e negou-se nesse momento a voltar a acender.

O Hotel fora procurado com cuidado, estava perto da Praça do Marquês de Pombal, era antigo mas fora renovado totalmente havia pouco mais dum ano, e a valoraçom dos clientes que aparecia na Internet levava um 8,5 sobre 10. Aliás, o preço era do mais interessante, pois os demais hotéis que encontrámos estavam todos por cima e os mais baratos tinham muitos inconvenientes. E além disso a estaçom do metro estava mesmo na porta.

Os quartos eram novos e estavam perfeitamente acondicionados, além de serem todos diferentes. Fiquei contente da escolha, era ali que íamos passar duas noites os dez membros da delegaçom galega que nos deslocámos a Lisboa. (onze membros se somarmos o jornalista e amigo de La Voz Joel Gomes, ainda que nom parava no nosso hotel) .

Como chegáramos umhas horas antes do grupo no que conduzia Cristóvão, saimos de passeata por Lisboa e fomos cear ao Bairro Alto na mais antiga cervejaria de Lisboa A Trindade; um bom acerto a recomendaçom do Estraviz e a Manuela.

De volta ao hotel encontrámo-nos com os outros cinco expedicionários, umha grande alegria acho que nos dominava a todos.

Foto-reportagem em Lisboa
(07-08 de Abril de 2008 | Fotografias: Ângelo Cristóvão)

Para a Assembleia da República

No carro vinhera uma pesada caixa de livros da AGAL, e era objectivo nosso leva-la até a Assembleia da República onde pensávamos fazer o reparto deles, e estando o carro parado em lugar proibido, e vendo que já esquecera isso de nom acender, só girar a chave funcionou óptimo, acordámos repartir-nos e uns ir de metro e os outros de carro até Sam Bento.

O acto começava às 10h30 e ainda nom eram as 9h30 e já estávamos todos ali, sendo os primeiros em chegar. De seguida comprovámos, que no livro do registo de admissões à A.R., figuravam todos os nossos nomes. Ao pouco chegou um catedrático da Universidade de Lisboa, Fernando Cristóvão, bom amigo de Estraviz e rapidamente se encheu com um bom pacote de livros que o fijo felicíssimo (rápido tirou um saco de plástico dum bolso do casaco), foi o começo duma rápida e amável pressom de diversos intervenientes interessando-se polas publicações da AGAL, a tentarem todos apanhar algum livro, até que o pacote se acabou, salvo meia dúzia de exemplares que previsoramente ainda ficavam no carro (eram para a CPLP); ali estavam os nossos congressos internacionais, o dicionário quadrilíngue de Carlos Garrido, os Estudos Galego Portuguesas, da Fala e Escrita de Carvalho Calero etc etc. O Estudo Crítico e o Prontuário. Pola sua parte Cristóvão levava vários exemplares de dous interessantes livros, o de António Gil 25 anos de sociolinguística e literatura e A influência da Obra de Lluis Aracil nas Políticas Linguísticas que corrêrom sorte parelha.

O carro nom ficara bem situado e foi-se mudar de sítio. Infelizmente tinha umha roda já travada e houvo que largar sessenta euros para poder fazer-se com ele. Depois foi deixado na área de autoridades do estacionamento da AR onde, ao sermos convidados, estava autorizado e sob o controlo da GNR.

Às 10h10 já estávamos dentro da AR, na sala do Senado (hoje nom existe senado mas é uma relíquia da sala dos pares do século XIX e do senado que existiu na Primeira República em 1911).

À entrada do acto entregou-se-nos umha pasta em que estavam as nossas comunicações e diversa informaçom, entre ela umha fotocópia do Diário da República de 23-8-91 em que se publicou o texto do acordo ortográfico de 1990, e onde se cita a existência da delegaçom de observadores da Galiza.

O Presidente da AR Jaime Gama abriu o acto, eram já passadas as 11h00. O Presidente da Comisão de Ética, Sociedade e Cultura Luís Marques, enquadrou o feito da Conferência e Audição, que de acordo com o Regulamento da Câmara ia ter lugar esse dia, passando logo a palavra aos intervenientes:

Adriano Moreira, Presidente da Academia de Ciências de Lisboa, numa breve intervençom que ao dia seguinte achei num jornal de distribuiçom gratuita, insistiu nas bondades do Acordo ainda que segundo ele era lástima que o Acordo seja um tratado e nom umha simples declaraçom de vontade dos estados, pois para ele isso é algo muito mais simples e efectivo.

Evanildo Bechara, Presidente da Academia de Letras do Brasil, fijo umha bela comunicaçom onde debulhou as questões a ver com o Acordo, com esse jeito dele formoso e preciso.

Albertino Bragança quem é escritor e umha das personalidades mais importantes de São Tomé e Príncipe (Estado assinante do protocolo adicional do Acordo), país em que preside ao Partido Democrático, e em que ocupou todo o tipo de postos, incluídos ministeriais. Apresentou as questões a ver com o Acordo de jeito muito pessoal e original pondo sobre a mesa aspectos a ver com as relações dos povos dos estados africanos com a língua portuguesa e as relações com as suas línguas nacionais.

Amélia Mingas, Presidenta do Instituto Internacional da Língua Portuguesa, ligado a CPLP, e com a sede na cidade de Praia em Cabo Verde, deu a comunicaçom provavelmente mais apaixonada. Esta Angolana que tem trabalhado muito a prol das línguas nacionais angolanas, o Iwoyo, kikongo e Kimbundu, licenciada em literatura germânica e doutora pola Sorbonne em Ciências da Linguagem, declarou falar a título pessoal e nom na sua condiçom de Presidenta do IILP, e trouxo a debate questons a ver com a língua portuguesa que iam para além da simples discussom do Acordo.

Pouco depois das 12h00 acabárom as intervenções. E trás um rebulir com uns e com outros e falar com a gente da imprensa, juntei-me a Jaime Gama, Luís Marques, às personalidades que vínhamos de escuitar, aos responsáveis dos grupos parlamentares, a Vasco Graça Moura a Carlos Reis, ao Secretário Executivo da CPLP Luís de Matos, Helena da Rocha, e umha encantadora deputada socialista da que infelizmente esquecim o nome.

Fijemos um percurso polo edifício da A.da R. guiados pola amável e atenciosa Elisabeth, guia do edifício, e o próprio Jaime Gama que nos ensinárom o velho Paço de São Bento e a sua história e os seus segredos todos. Acho que falei com todo o mundo e com todos tentei estabelecer laços que ultrapassem no futuro o simples facto de ali coincidirmos. Com Luís de Matos falei da reuniom que ia haver ao dia seguinte na CPLP, e forneceu-me interessantes informações que desconhecia. Com Albertino Bragança adquirim alguns compromissos aos que lhe tenho de dar resposta. Com Amália Mingas, o nosso foi empático, muito nos rimos, entendia o que se passa na Galiza maravilhosamente, ao dia seguinte despertei-na telefonando-a ao seu hotel. Espero que a nossa relaçom perdure, o seu olhar e o seu falar franco e sao é um prazer. Fazer amizades assim já paga a pena tudo. Com Luís Marques fijemos-nos interessantes e deliciosas confidências

A comida tivo lugar no novo edifício anexo inaugurado há dez anos e onde estám os escritórios dos 230 deputados.

O almoço foi realmente de abades e os vinhos impressionantes. Fum colocado à beira de Carlos Reis, com quem vim a falar de temas ligados à formaçom. A existência dum amigo comum, Elias Torres, facilitou muito a nossa aberta relaçom, e de facto ficámos em estabelecer contacto entre a nossa Associaçom e a sua Universidade por questões de mútuo interesse. Em frente estava o representante do PCP João Oliveira, e Helena Rocha, e a agradável deputada do PS de que esquecim o nome (peço-lhe desculpas se me lê). Estava também ao lado de Carlos Reis esse magnífico poeta e latinista que é o deputado europeu Vasco Graça Moura. A relaçom entre todos foi cálida e cordial e a conversa muito agradável deslizou-se sobre questões a ver com o Acordo e muitas cousas mais.

Ao sairmos para as intervenções de Vasco Graça Moura e Carlos Reis, ainda demorei um bom bocado atrás do grupo indo de palique com Amália Mingas.

Pouco depois das 14h30 começou a Audição Pública, essa interessante figura que recolhe o Regulamento do Parlamento Português.

Estava presidida por Teresa Portugal vice-presidenta da Comissão de Ética, Sociedade e Cultura acompanhada sempre do Presidente da Comissão Luis Marques e os representantes parlamentares: João Oliveira do PCP, Ana Zita Gomes do PSD, Pedro Matos do CDS, e Luís Fazenda do BE. Teresa Portugal defendeu a posiçom do PS.

Vasco Graça defendeu o nom ao Acordo com um seu discurso e argumentário cheio de interesse e do qual estavam todos na sala perfeitamente apercebidos, pois os argumentos vinham sendo repetidos polo conferencista na imprensa.

A contra-réplica de Carlos Reis resultou do ponto de vista da oratória muito mais efectista e foi dando-lhe a volta um a um aos argumentos anteriormente expostos.

Logo falaram, o amigo e lexicógrafo Malaca Casteleiro. Godofredo Oliveira, Presidente de Geolíngua (já nos enviou umha notícia para o PGL). Helena Rocha Freire (uma velha partícipe nos Acordos). Fernando Cristóvão da Faculdade de Letras de Lisboa. Rui Beja (Presidente dos Editores e o primeiro a falar em contra). E Alexandre Banhos.

Coloquei-me de pé por ser uma posiçom na qual me sinto mais à vontade e pensava dissimular assim mais o meu nervosismo (é-me conatural). Porém, o facto de ter que pegar no microfone com uma mao e ir passando as folhas com a outra, levou-me a perder o carreiro nalgumha ocasiom. Numha delas introduzim a frase duma missiva de Castelao a Sanchez Albornoz em que afirma que "desejo, além disso, que o galego se aproxime e confunda com o português" mudando-a por outra em que era o próprio Castelão quem aspirava a confundir-se com um português.

Luís Costa falou em contra com razões lingüísticas. O Presidente da Associação Timorense véu pôr de relevo problemáticas muito específicas desse Estado. Ângelo Cristóvão estivo sereno e soberbo na sua comunicaçom. Seguírom-se ainda quatro intervenções mais, todas elas cheias de interesse.

Polos grupos Parlamentares, nom houvo nengum grupo que se manifestasse contrário ao Acordo, ainda que PCP e CDS tinham posições muito parecidas, sendo de extremos opostos. O PS foi firme a prol, o PSD foi firme a prol ainda que com críticas aos socialistas. Polo Bloco de Esquerda falou Luís Fazenda, um velho conhecido meu e um grande amigo da Galiza.

Uma hora antes do tempo previsto a Audição tinha finalizado e todos os galegos estávamos felicíssimos, conscientes de termos participado num feito histórico.

Todos os demais membros da Delegaçom galega nom citados anteriormente, mas que figuravam na relaçom de pessoal convidado à Assembleia da República, eram: Isaac Alonso Estraviz, Margarida Martins Vilanova, Martinho Monteiro Santalha, Manuela Ribeiro Cascudo, Xavier Vilar Trilho, Concha Rousia, António Gil Hernandez e Teresa Carro. Ademais estava dum outro jeito o Joel Gomes.

A presença galega na AR percebia-se ao primeiro golpe de vista. Todos os que ali estávamos faziamos contactos, dávamos a conhecer a problemática do nosso País e trabalhávamos para que a Galiza caminhe no futuro no ronsel da Lusofonia, e que actos como este nom sejam mais excepcionais e fagam parte da nossa normalidade, que seria a melhor das garantias de futuro.

A Assembleia da República, convidando-nos para tratar nela acerca dum assunto competência do Parlamento Português e para o povo português, estava a dizer, 'eh amigos, a Galiza também tem a nossa língua, vocês nom som outros', e estava a dizê-lo nom a nós, senom ao povo português todo e a todos os povos da CPLP, e isso enceta um novo patamar das relações da Galiza com o resto do mundo que usa e cuida a nossa língua.

Foto-reportagem na Assembleia da República
(07 de Abril de 2008 | Fotografias: Ângelo Cristóvão)

Para a ceia no Brasuca

No processo prévio a irmos a Lisboa para participarmos como convidados na Assembleia da República, no que era um feito histórico, enviamos a todos os associados da AGAL em Portugal informações, ademais de agradecer-lhes a ajuda que uns quantos deles proporcionam(ram) para este tipo de assuntos.

Pensáramos em fazer um jantar na terça dia 8 em Lisboa com os agálicos e amigos que por lá moram, mas Luzia Teixeiro, responsável do grupo da AGAL em Lisboa e alma mater do grupo gz.pt, considerou que era muito melhor na segunda e umha ceia.

Mandamo-nos telefones, de novo comunicamos com os amigos e amigas agálicos e simpatizantes e ao final a Luzia encarregou-se de localizar um local no bairro alto para a nossa ceia ou jantar lisboês.

O local foi o Brasuca, muito recomendável para quem vaia por lá e gostar de descobrir um lugar com sabores transfiguradores e fantásticos, que bom estava todo, que bem o apontava essa meiga das palavras que é a Concha Rousia. Às 20h30 combináramos encontrar-nos todos no Largo de Camões.

Estava um dia de vento e chuva, às 20h30 nom aparecera ninguém, Estraviz e Manuela estavam a fazer umhas gestões; Cristovão e os seus acompanhantes de carro, estavam na Brasileira, Teresa Carro também andava por algures; a Margarida e eu próprio estávamos ao vento e à chuva dando voltas na praça e já duvidando se nom se daria algumha confusom, pouco depois recebemos umha mensagem no telemóvel da muito cara agálica, Margarida Santos, umha portuguesa que é verdadeira portugalega comprometida com a Galiza, dizendo-me que infelizmente é-lhe impossível vir ter connosco, que muito gostaria e que a desculpemos.

Quando estávamos perto de dez minutos para às 21 horas, num canto do espaço no meio do largo, vemos duas almas com cara também de estarem à procura como nós, achegamo-nos e eram dous dos moços galegos que vivem em Lisboa e que ali fam o que podem para apresentar a Galiza e as suas peculiaridades "literárias e linguísticas" aos portugueses. Por fim respirávamos, chamamos a Luzia que já vinha de caminho, e activamos a presença de todos, chamei aos membros da expediçom a Lisboa, e pouco a pouco fomo-nos juntando um grupo sob o olhar imperturbável de Camões.

Luzia que tem o olhar mais transparente que vim no mundo e a face luminosa como umha lua na mais formosa noite de luar, rapidamente pujo a comitiva a caminhar cara o Brasuca. O lugar fecha às segundas mas esse dia abrira para nós.

Logo me chama o Joel para pedir o lugar exacto e poder vir à ceia também. O encontro foi delicioso, muito falamos todos enquanto a refeiçom se alongava no tempo, iam ser mais das duas da manhã quando nos metemos no leito.

Para conhecermo-nos todos bem foi cada um fazendo a sua apresentaçom, muitas dérom lugar a perguntas e a gerar fios de conversa que logo dérom num lindo novelo multicor.

Eis os participantes na ordem das suas apresentações: António Gil. Margarida Martins. Inácio Vilarinho, um galego professor em Lisboa e a primeira alma que víramos no Largo de Camões. Concha Rousia, elucidou-nos sobre a Rousia. Martinho Monteiro Santalha. Pedro Roirinha um português de Cascais muito firme a prol da Galiza. Miguel Arce a segunda alma do Largo de Camões e outro a difundir a realidade da literatura galega em Lisboa. Manuela Ribeiro. Isaac A. Estraviz, fijo a Luz sobre o assunto da participaçom galega nos acordos ortográficos do 86 e 90.

Henrique Salas da Fonseca, um português amigo de Cristóvão que tivo a gentileza de compartilhar o seu tempo connosco, e a quem é sempre muito doado achar em toda cousa que se fijer por Portugal a ver com a Galiza. Ângelo Cristóvão. Manuel Montecelo, que trabalha no laboratório de Física da Universidade Politécnica de Lisboa, a mesma onde está de professora a nossa amiga Tânia Rocha, outra pessoa que enviou desculpas por infelizmente receber o recado demasiado tarde para estar connosco. Rodrigo Porto, um técnico agrícola acho que da Terra Chã que fomos conhecer a Lisboa. Teresa Carro, de quem vinhemos a saber que tem avós portugueses de Monção.

Xavier Vilar Trilho. Joel Gomes. Alexandre Banhos. Luzia Teixeira, quem procurou o lugar e dinamizou Lisboa para termos sucesso e alegria. No dia 24 o grupo GZ(ponto)PT participa no Arraial do 25 de Abril, tenhem só uns quinze livros da AGAL umha bandeira e pouca cousa mais, isso é como umha feira e necessitam cousas (autocolantes, chapas, bandeiras...) e ajuda da Galiza, todo o que se lhe poda enviar (dentro das nossas terríveis limitações agradecêrom-no muito). Marta Negro que fijo umha muito pertinente reflexom ligando a política oficial da Galiza com o blaverismo no âmbito da línguas catalã. Rui Pires, um físico, também ligado à Politécnica de Lisboa, é um português para quem houvo um antes e depois de Nunca Mais e trás Nunca Mais véu o compromisso solidário com a Galiza.

Ainda falámos das pessoas que infelizmente nom estavam ali connosco e que muito gostariam de estar e de muitas outras cousas. Perguntárom se podemos participar em actos que eles organizam em Lisboa, portanto os leitores que podam animem-se.

Para quem queira descobrir o Brasuca, – paga a pena – há que ir pola rua Século, indo desde o Largo de Camões, e dali sai uma ruela que se chama João Pereira da Rosa, é no nº 7.

Foto-reportagem ceia organizada pola AGAL em Lisboa
(07 de Abril de 2008 | Fotografias: Ângelo Cristóvão)

Fonte original:

Apresentação da Academia Galega da Língua Portuguesa nas Jornadas de Língua em Ourense

  • Escrito por: A Esmorga
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Ângelo Cristóvão, Concha Rousia e Irene Veiga

Entrevista a Ângelo Cristóvão, presidente, e
Concha Rousia, vice-presidenta da Pró

A Esmorga / MDL / PGL - A Associação Pró-Academia Galega da Língua Portuguesa foi constituída em 1 de Dezembro de 2007, dia da Restauração da Independência e aniversário do primeiro acto público de Nunca Mais, com o objectivo de apoiar a criação duma Academia Galega da Língua Portuguesa (AGLP). Nesta segunda, 14 de Abril, Ângelo Cristóvão, presidente da associação, e Concha Rousia, vice-presidenta, participarão nas I Jornadas de Língua em Ourense apresentando este projecto na cidade das Burgas.

A ideia que os promotores têm da Academia como motor de integração da Galiza na lusofonia, difere doutros modelos académicos, pois neste caso pretendem «uma instituição nacional galega criada por iniciativa da sociedade civil, independente dos organismos do estado [...], que recupere e ponha em valor o nosso património linguístico e literário, ora maltratado, ora esquecido, ora deturpado», com bem indica Ângelo Cristóvão no web oficial da Associação Pró-AGLP.

Como bem sendo habitual durante o decorrer de todo este evento, lançámos uma série de perguntas às, desta vez, duas pessoas convidadas às Jornadas ourensanas, com o objectivo de conhecermos em primeira mão algumas das suas opiniões. Lembramos que a palestra em que estarão Ângelo e Concha decorrerá a partir das 20h00 no CS A Esmorga (rua Telheira, 9, rés-do-chão - Ourense).

Depois de terdes participado na histórica jornada em que uma delegação de galegos e galegas se fez ouvir no parlamento da República Portuguesa, a defender a unidade da língua, qual é a vossa valorização do que isto pode significar para o futuro?

Ângelo - É difícil enxergar agora, tão de perto, a repercussão desses eventos, mas estou certo que nos próximos meses e anos teremos mais notícias positivas para a Galiza.

Concha - Eu penso que nem me vai ser possível mesurar o significado desta jornada; até porque o efeito vai depender das múltiplas reacções que vá ir provocando nos diversos campos da Lusofonia. Para mim significa a integração e o reconhecimento definitivos da Galiza como parte essencial da Lusofonia.

Depois disto, alguém poderia dizer que o galego não é português, ou que o português não é galego, mas saberia que estava mentindo ou praticando a autonegação, algo ao que a gente daqui está muito afeita. Temos tantos preconceitos sobre nós mesmos e sobre a nossa cultura como sobre uma cultura alheia. Mas Galiza está a mudar.

Como surgiu em vós a necessidade de criar uma Associação Pró-Academia Galega da Língua Portuguesa e qual considerais que devem ser as suas funções?

Ângelo - Primeiro foi Martinho Montero que, numa revista propunha, entre as tarefas para o futuro, criar a Academia (acho que foi em 1994). Anos mais tarde, em comentários pessoais várias pessoas em diversos momentos fomos refletindo sobre a possibilidade, a conveniência e o momento adequado.

Finalmente, em Outubro de 2006, Martinho julgou que o lugar e a altura certas eram os Colóquios da Lusofonia, em que se produziu um interessante debate. As funções principais de qualquer academia da língua são três: institucional, editorial e como referente normativo. No caso da AGLP já começamos a exercer a primeira. Logo virão as publicações. A terceira função não me parece uma tarefa urgente.

Concha - Em mim, imagino que como em certo modo ocorre a todos os demais, a necessidade duma Academia surge quando me percebo que os que reconhecemos a nossa língua como todo o que ela é ficamos órfãos e sozinhos, sem ninguém a velar pola nossa língua nem por as pessoas que, com todo o direito do mundo, a usam com normalidade.

A academia terá múltiplas funções, a de ser a interlocutora com as outras Academias na Lusofonia, a de editar as produções agora ignoradas e menosprezadas polos organismos até agora existentes no nosso pais. Terá, em definitiva, a função de cuidar da nossa língua dentro do nosso território e a de interlocutora nossa no resto da Lusofonia.

Conta-nos como correram os trabalhos que tendes desempenhado como membros da diretiva da Associaçom Pró-AGLP, desde a fundação da mesma e quais podem ser os trabalhos prioritários da entidade para os próximos meses.

Ângelo - Quando foi constituída, em 1 de Dezembro de 2007, elaboramos uns estatutos. Logo começamos a organizar a associação. Em 14 de Fevereiro tivemos uma interessante entrevista com o Dr. Joan Martí i Castell, presidente da Seção Filológica do Institut d’Estudis Catalans.

Concha - Apesar do pouco tempo que levamos trabalhado levamos feito muito. Eu como vice-presidenta da Associaçom Pró-AGLP tenho participado em labores organizativas. Entre os trabalhos prioritários para o futuro estão a posta em marcha definitiva da Academia, ajudá-la a dar seus primeiros passos como tal Academia, tentar que estabeleça relações de colaboração com as Academias dos outros países, participar nos eventos culturais e linguísticos que tenham lugar no espaço da Lusofonia e procurar o reconhecimento social que tem que ter na Galiza, dando-se a conhecer, mesmo a través da publicação de um boletim.

Quais achais que podem ser os principais entraves para a criação da Academia Galega da Língua Portuguesa?

Ângelo - A Academia vai ser criada, sem dúvida, e aqui não haverá grandes dificuldades. Será uma entidade cívica com vocação de serviço público. A marca foi previamente registada no Reino da Espanha e na República de Portugal. Ora, para desenvolver todas as funções próprias desta entidade, serão precisos uns recursos.

Talvez o apoio económico seja a parte fraca, atendendo às circunstâncias sociopolíticas em que se desenvolve o País. Contudo, não precisamos milhões para produzir obras de valor. A internet fornece muitas possibilidades.

Concha - Penso que os custos económicos podem, em princípio, obrigar-nos a ter que ir mais devagar com os nossos projectos, acho que é só.

Ouvir áudio da palestra
[Atualização a 29 de abril de 2008]

Apresentação da AGLP nas Jornadas de Língua em Ourense

Descarregar áudio em MP3

Fonte original:

Crónica do invisível (e II). A chavinha de vidro

  • Escrito por: Concha Rousia
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Concha Rousia
Concha Rousia

Portugal está pechado
c’uma chavinha de vidro
se essa chavinha se perde
Portugal fica perdido.

Da Brasileira fomos ao restaurante guiados pola mocidade de AGAL de Lisboa, éramos vinte, três ou quatro éramos portugueses, outros éramos os que chegáramos o dia anterior, outros éramos galego-portugueses simplesmente. Foi um jantar-ceia inesquecível: as caipirinhas, o picadinho mineiro, o sorvete de maracujá, o café, de novo o café... Mas o café só veio ao final; antes vieram as apresentações, que foram ideia do Alexandre, que ia anotando os nomes num livrinho pequeno...

O primeiro em falar foi Antonio Gil, e a seguir fomos um por um despindo nas palavras e nos risos e brincadeiras tudo o que éramos e o que não éramos. Foi uma festa... um convívio entranhável, que fez com que a cama tivesse que aguardar por nós... E de novo o metro, linha azul, depois amarela; entramos no hotel lá perto das duas da madrugada, mas o corpo ainda não nos pedia cama, não... 


Ceia AGAL


Nós, caros e caras que estais a ler esta crónica, sentíamos a necessidade de saber de vós, de saber que vós sabíeis que tudo fora bem; foi nesse instante que eu entendi o argumento sobre a necessidade da Trindade que exprimira Xavier quando íamos a caminho de Lisboa... “Se Deus é amor, necessita amar, daí a necessidade do Filho, mas para que tenha existência real, a cena necessita ser contemplada por um terceiro: o Espírito Santo...”

Não estou a dizer que vós fosseis o Espírito Santo, mas isso é exactamente o que estou a dizer mesmo... Nós tínhamos falado, e tínhamos sido ouvidos, mas para nós saber isso, para que isso fosse realmente certo, nós necessitávamos a segurança de que vós nos tínheis visto. O portátil do Ângelo não nos dava para conectarmo-nos à rede desde os quartos por causa de um antivírus de última hora, e foi a net de moedas, como as antigas cabinas de telefone, que nos permitiu vermos-nos, vermos-nos através de vossos olhos...


Ceia AGAL


Nunca esquecerei a imagem do hall do hotel... lá na esquina Martinho não cessa de meter moedas para que a máquina nos siga mostrando o PGL, eu que ficara preocupada porque a minha câmara se tinha parado no minuto três da intervenção de Alexandre fiquei de boca aberta ao ver que já lá estava no portal... parecia uma miragem.

Aos poucos a gente foi indo para a cama, eu fiquei de última esgotando os minutos que restavam por gastar na cabina-net. Abri meu correio. Tinha uma mensagem de Selmo Vasconcellos, que me avisava de que no número 51 de “O Rebate” revista que ele dirige em Porto Velho (Rondônia), saíram seis poemas meus. Pareceu-me um bom sinal receber aquela mensagem vinda do Brasil em Lisboa; a noite não podia ter melhor final para mim.

Na máquina esgotaram-se os minutos. Fora seguia a chover; quando já me ia, o guardinha do hotel desejou-me boa noite e falou-me de que antes chovia no Norte e agora chovia em Lisboa... Quem sabe este guardinha não seja do Norte, desses que nós enganávamos nos nossos jogos; quase quis perguntar mas vi que tinha cara de muito falador e simplesmente lhe respondi ao da chuva, os dous concordamos com que o tempo anda com o de acima para abaixo...

De manhã no pequeno almoço acabamos de organizar as actividades nas que já tínhamos falado nos dias anteriores... e que já agora, não incluíam uma visita pausada e afectuosa a esta cidade que nos dava o que tinha: sua alma. Em muitos momentos eu senti a necessidade de pedir perdão a Lisboa por não a poder visitar como ela, senhora que é, merece; mas prometi-lhe voltar...


Subir ou descer


Os trabalhos foram repartidos muito bem, escritórios para visitar, documentos para apanhar, embaixadas que informar... e num par de horas no hotel para outra sessão de trabalho. Foi uma jornada muito frutífera; ficamos satisfeitos com os planos de futuro, que já são pressente; julgamos que encontramos alguns aliados que nos vão ajudar no cuidado dessa chavinha de vidro que nos abre as portas da Lusofonia. De novo almoçar para ir depois a visitar a Academia de Ciências de Lisboa.


Indo à Academia das Ciências de Lisboa


A cita era as 16:30, e era com o Presidente da Academia, o Dr. Adriano Moreira. Fomos de metro, de novo a linha amarela e a azul... Chovia, íamos partilhando os guarda-chuvas como partilhávamos nossos destinos, e nossos encantamentos de como todo ia saindo... Desde a parada Baixa-Chiado fomos a pé até a Academia... esses foram os escassos momentos com luz de dia que andamos algo pola cidade, mas sem parar de andar... Chagamos.

O senhor Presidente da Academia recebeu-nos como membros da Academia Galega. Um senhor com saber diplomático; sentado entre o Ângelo e o Alexandre manifestou interesse por nós, pola nossa Academia, polas futuros relacionamentos, pola Galiza... no plano mais pessoal ao final nos disse que ele era de Bragança, por tanto vizinho do Norte; rematou a reunião e antes de nos ir embora mostrou-nos a biblioteca...


 Foto-reportagem Academia das Ciências de Lisboa
(08 de Abril de 2008 | Fotografias: Ângelo Cristóvão)


Impressionante, por dizer alguma palavra. Tiramos fotos dos tesouros linguísticos e da estância. Era hora de partir... Lisboa parecia querer-nos pegar nos pés, mas havia muita distância que percorrer. Voltamos ao lugar do carro, fomos às compras de última hora... Eu tinha uma encarga, só uma...

Quando o domingo sai de casa minha filha disse: trai-me ovinhos moles de Aveiro. E eu fui a procura disso, e de umas revistas das Winx, que ela adora. Na livraria tivemos que tirar uns dos outros porque os livros nos prendiam... parecíamos esfameados que sabiam que apenas tinham uns momentos e depois a estrada os separaria desta liberdade de escolher leituras. Trouxemos connosco dicionários e outros livros, e eu ainda entrei numa loja para trazer vinho do Douro...

O caminho de volta foi igual de intenso que o de ida, as conversas, agora depois de tantas horas juntos até tínhamos a sensação de nos conhecer melhor, como de toda a vida... Paramos nas beiras do Porto para comer um bocado e compramos a imprensa. Lá por volta das duas da madrugada chegamos a Padrão depois de passar por Pontevedra; ainda ficavam Compostela e Corunha a aguardar por alguns de nós.


De volta de Lisboa


Esta viagem saciou-nos de tudo o que nos leva faltado durante tanto tampo, saciou-nos com respeito por nós, por nós ser o que somos; isso que se nos nega na nossa própria terra e que Portugal, desta vez muito generoso, nós ofereceu, e por uns dias nós fez sentir o centro do universo. E nós, guerreiros e guerreiras contra o silêncio e o esquecimento, prometemos cuidar da chavinha de vidro, que nunca, nunca vamos deixar partir...

Crónica do invisível (I). O mar em Lisboa

  • Escrito por: Concha Rousia
  • Categoria: Info Atualidade
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Concha Rousia 
Concha Rousia

- Mas que há de novo lá por Lisboa?
- Coisa má nenhuma, somente ouvi dizer que o mar se volvera papas...

Partimos de Padrão, dai fomos a Pontevedra, onde se uniu a nós o quinto ocupante do carro. Martinho mostrou-nos o ponto exacto onde mataram Alexandre Bóveda. Sentimo-nos muitos no carro, mais dos que éramos, e éramos muitos...

O trajecto até Lisboa foi um fio de palavras. As conversas foram connosco, o já feito, o por fazer... O cansaço tomou logo conta dos corpos, paramos, Ângelo pode assim descansar os olhos enchendo-os de verde em lugar do negro do asfalto. Tiramos a primeira foto. Eu lembrei-me, como é meu costume, de todos os que estavam connosco sem estar... entre eles Rosalia, entre eles Bóveda, entre eles a minha mãe a me ensinar o cantar da joaninha:

“Voa joaninha voa, que teu pai vai em Lisboa, e vai-che traguer pão e cebola...” –deves repetir até que a joaninha voar...  


A caminho de Lisboa


E a canção do “Malhão” que eu sempre julguei era galega e depois foi que aprendi que o não era. Aqueles foram tempos em que eu vivia de verdade imersa na lusofonia... e as nossas casas feitas polos castrejos de Castro Laboreiro, e o senhor João, e o Freitas que traz café, sabão, e as duas mulherinhas de olhos gázios, mãe e filha, a nós trazer os panos de cozinha, os refaixos, e as toalhas, e a feira de Santos de Montalegre... e os bois, e a chega, e subir as calças, e os guardinhas sempre a perguntar:

- Mas que há de novo lá por Lisboa?
- Cousa má nenhuma, somente ouvi dizer que o mar se volvera papas.
- Mas isso não pode ser...!

E atravessar um lameiro e do outro lado é Portugal... “Mas como pode ser isso?” De crianças procurávamos entender o que era a fronteira; depois fomos aceitando que era invisível, que era algo no que se falava, algo que nos obrigava a ir classificando tudo...

A canção do Malhão é portuguesa... A da Carolina é galega. Eram tempos sem televisão, e as rádios, como nós, também não aprenderam a parar suas ondas em raias imaginárias e nós sentíamos Montalegre ali pertinho. É estava mesmo.

Hoje o mundo recoloca-se todo dentro de nós e as conversas vão servindo de apoio a este processo que vai tendo lugar em cada um de nós... e o acordo do 86, e o do 91, e os que chegaram a Lusofonia pola via do estudo e a análise profunda, e os que simplesmente nascêramos ali, e depois se nos arrancou para nos transplantar na Hispanofonia... Eu fui desses que não chegaram a prender; e hoje mentes o carro vai bebendo os ventos que nos falam do futuro, vamos abraçando naquinhos esquecidos do nosso passado... E como sempre, era à terceira que os guardinhas eram enganados...

- Mas que há de novo lá por Lisboa?
- Coisa má nenhuma, somente que quando eu vir, vi como a gente toda, grandes e pequenos, homens e mulheres, iam com colheres a correr para o mar....
- Aió, pois olha que vai ser certo que o mar se volvera papas...!

E os guardas do nosso jogo corriam também para o mar, e a raia era livre e nós passávamos de um lado para o outro vencedores ao final.

E chegamos a Lisboa; ao pouco tempo veio o Estraviz e Manuela, e depois Alexandre e Margarida; Joel ligou para nós, ao telefone de Ângelo, e combinamos para o dia a seguir, o dia da Assembleia da República. E lá estava eu, começara enganando a uns guardinhas há perto de quarenta anos e agora era eu a que viera até Lisboa com a minha colher. Era tarde, mas ainda levávamos trabalhinhos para ser acabados no silêncio dos nossos quartos. Foi um momento no que eu agradeci todos os conselhos que me foram dados. Dormimos.

De manhã, logo de um pequeno almoço, ao que, a meu modo de ver, o nome não lhe liga nada bem, fomos para o Palácio de São Bento; uns de metro e outros no carro de Margarida para carrejar os livros; já lá estavam Teresa e Rodrigo. Fomos os primeiros em chegar, os galegos e galegas chegamos mesmo antes de que se abrissem as portas.

Éramos onze em total, todos convidados pola Assembleia. Todos respeitados como membros da Lusofonia, e assim nos receberam, e assim no-lo fizeram sentir também os primeiros portugueses que foram chegando, reconhecendo aos mais velhos entre nós, falando em encontros passados, e fazendo sonhar aos mais novos com um dia ser assim reconhecidos polos que hoje aqui encontrávamos.

A manhã começou a ir deixando passar os oradores. Abriu a sessão o Presidente da República; a seguir falou o presidente da Academia de Ciências de Lisboa; depois veio Bechara e o abraço morno do Brasil; falou também o representante de São Tomé e Príncipe; e finalmente, com uma energia que se fez notar, fechou esta sessão a Presidenta do Instituto Internacional da Língua Portuguesa (CPLP).

Antes de a gente ir a almoçar, os corredores se encheram, as mãos se encontraram, os cartões e os livros mudam de lugar, os sorrisos, os jornalistas, as televisões, o descanso, a imensa escalinata, o bacalhau, o vinho verde, a sobremesa e o café, ai o café... o café aqui é outra cousa, o café aqui é “o café”...

De volta na nobre sala continuou a jornada. Falou o primeiro dos convidados, Vasco de Graça Moura, que não soube estar a altura de si mesmo, talvez por ele se saber perdedor antes de abrir a boca. Atrás dele falou Carlos Reis, que o derrubou com a primeira frase, e continuou a falar com palavras e com suas mãos e com seus olhares vivos e sinceros, e com verdades... e no momento da pausa todos o quiseram cumprimentar e nem foi possível para todos conseguir isso. Na pausa voltaram as conversas e os abraços e os irmãos que nos chamaram de irmãos... sim, definitivamente, por incrível que pareça, o mar se volvera papas e eu fora lá convidada.

A pausa foi breve e pronto voltamos todos à sala. A mesa estava agora integrada polos representantes dos diferentes grupos parlamentares, e ante eles falaram todos os da audiência que tinham turno para isso. Começou a sessão Malaca Casteleiro. Ele estava sentado do lado dos galegos, junto dele estava Bechara, e o outro dos três daquela bancada era Estraviz; eu tive o privilégio de tirar a foto. Lá permaneceram os três, eu lembro ter pensado que nem sempre é por acaso que o destino junta a gente.

Atrás de Casteleiro falaram o resto de oradores; todos se foram alinhando com o discurso de Carlos Reis e o apoio ao acordo ortográfico, com alguma excepção, como a do livreiro que parecia magoado por ter que destruir tanto livro como há na norma antiga... e ele não reparou em que isso nunca se tem feito ao longo da história, se isso se fizer poucos livros de valor haveria nas bibliotecas das Academias; mas enfim, ele falava em nome dos livreiros...


Alexandre Banhos na Assembleia da República


Finalmente chegou a nossa hora, a hora dos galegos... Eu estava sentada no meio, equidistante entre Alexandre e Ângelo, os nossos oradores; agora era a nossa voz que ia encher a sala. Primeiro falou o Alexandre, e todos falamos com ele; depois falou o Ângelo, e todos falamos com ele.

Falamos bem e fomos cumprimentados depois, saudados, parabenizados, e até talvez por algum, temidos, os galegos... Nós, contentes, nossa pertença a Lusofonia tornara-se o que tinha que ser: óbvia... Não podemos saber aonde poderemos chegar, sabemos é que lá chegamos, e sabemos que vínhamos de muito longe e não nos vamos precipitar agora que estamos mais perto... Nós entraremos onde quer que tenhamos de entrar...


Ângelo Cristóvão na Assembleia da República


Como lhe dizia o Ângelo ao representante do PCP “Os galegos entramos na Lusofonia pola porta grande” E eu reparei que as portam eram muito grandes, e como no conto dos guardinhas, que deixavam o passo livre, estas portas foram abertas para nós passar... E nós passamos, e nos sentimos em casa, aquele espaço era nosso.

Com o final da tarde vieram as despedidas e os planos de futuro. Mas o dia ainda não ia acabar ai para nós que estávamos sendo aguardados no Baixo Chiado, lá na Brasileira, polos membros de AGAL de Lisboa que nos prepararam uma festa que coroou um dia que nascera republicano... Na porta da Brasileira, sem medo da chuva que nos seguira até Lisboa, tiramos nossas fotos com Pessoa, mesmo parece que levava muito tempo a nos aguardar... (a seguir)


Na Brasileira

 Fonte original:

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