As académicas galegas participaram, em 29 de março, num ato na Academia Brasileira de Letras, no Rio de Janeiro, onde foram recebidas junto da comitiva dos Colóquios da Lusofonia pelo Presidente da ABL, Marcos Vilaça, e o gramático e lexicólogo Evanildo Bechara.
O encontro, com numeroso público assistente, começou às 14 horas com as intervenções de Chrys Chrystello, Presidente da Comissão Executiva dos Colóquios da Lusofonia, Concha Rousia, da Academia Galega da Língua Portuguesa, e Malaca Casteleiro, da Academia das Ciências de Lisboa. A intervenção galega levou por título "A participação galega nos Acordos Ortográficos: Poder e responsabilidade".
Essa mesma tarde, dirigiram-se para o Real Gabinete Português de Leitura, a mais antiga instituição cultural do Brasil (1837), onde assinaram o Protocolo de Colaboração e Apoio Recíproco entre a AGLP e o RGPL. O evento incluiu um recitado de poemas de Rosalia de Castro, Guerra da Cal e da própria autora, Concha Rousia, acompanhada da guitarrra de Isabel Rei.
A viagem das académicas galegas vai conduzi-las a Florianópolis, onde terá lugar em 31 de março, no Instituto Federal de Santa Catarina, a Sessão Inaugural do Instituto Cultural Brasil-Galiza, organismo binacional com a presença da presidente brasileira, Silmara Annunciato, e Concha Rousia (presidente galega). Será apresentado também o programa de atividades, que inclui uma "Exposição da Cultura Galega", com painéis explicativos sobre história, arte, música, literatura, política, economia e língua, que irá sendo levado por diversos estados do Brasil.
O programa inclui outros encontros e palestras em várias instituições, como a Universidade Federal de Santa Catarina, e intervenções no Colóquio da Lusofonia, que vai ter lugar de 5 a 9 de abril.
A participação galega nos Acordos Ortográficos
Intervenção de Concha Rousia na Academia Brasileira de Letras
Rio de Janeiro, 29 de março de 2010
Exmo. Sr. Presidente da Academia Brasileira de Letras, Prof. Marcos Vilaça; Exmo. Sr. Prof. Evanildo Bechara e demais académicos brasileiros; caros professores Malaca Casteleiro e Chrys Chrystello, prezados colegas, Senhoras e Senhores:
Agradeço, em nome da Academia Galega da Língua Portuguesa, o convite para participar neste ato numa instituição de tanta importância não só para o Brasil, como também para a nossa língua comum. Começo a minha intervenção lembrando e honrando a memória de Ernesto Guerra da Cal que foi, no Brasil, o maior defensor da dignificação da língua e cultura da Galiza, através da sua reintegração no português comum.
Conforme às informações da tese de doutoramento de Joel Gomes, recentemente apresentada na Universidade de Santiago, o nosso saudoso professor intervinha na Academia Brasileira de Letras em agosto de 1959, provavelmente nesta mesma sala, lendo um poema intitulado “Colóquio”. Em 17 de agosto desse ano recebia a medalha de Doutor Honoris Causa pela Universidade da Bahia, na altura da sua participação no IV Colóquio Internacional de Estudos Luso-Brasileiros. Ernesto Guerra da Cal foi convidado para ser um dos partícipes ao Acordo Ortográfico de 1986, tanto por Portugal como por Brasil. Na altura, ele aceitou assistir aos encontros na sua condição de galego, mas delegou no professor Isaac Alonso Estraviz, integrado na Comissão Galega, que assistiu às reuniões na Academia Brasileira de Letras junto de Adela Figueroa e José Luís Fontenla. A Comissão para a Integração da Língua da Galiza no Acordo de Ortografia Unificada, constituída em 1985, e presidida por Guerra da Cal e Jenaro Marinhas del Valle, estava integrada também por outras personalidades da vida pública como Paz Andrade, e associações culturais lusófonas.
Em 1 de outubro de 1990 Manuel Jacinto Nunes, presidente da Academia das Ciências de Lisboa, enviava carta à Comissão Galega solicitando “a presença de dois representantes galegos, para tomarem parte, como observadores, na mencionada reunião em Lisboa, de 8 a 12 de outubro de 1990”. A Delegação da Galiza no Acordo de Lisboa esteve integrada por José Luís Fontenla, Vice-Presidente Primeiro, e António Gil, Vice-Presidente Segundo da Comissão. Fontenla e Gil representaram o nosso país na condição de observadores, colaborando na redação do texto.
Como sabemos, o artigo 2 do Preâmbulo do Acordo Ortográfico indica: Os Estados signatários tomarão, através das instituições e órgãos competentes, as providências necessárias com vista à elaboração, até 1 de Janeiro de 1993, de um vocabulário ortográfico comum da língua portuguesa, tão completo quanto desejável e tão normalizador quanto possível, no que se refere às terminologias científicas e técnicas.
Em 1 de dezembro de 2007 criava-se em Santiago de Compostela a Associação Cultural Pró AGLP participando o seu presidente, Ângelo Cristóvão, em 7 de abril de 2008, na Conferência Internacional de Lisboa sobre o Acordo Ortográfico, realizada na Assembleia da República, em que também estiveram presentes outras entidades galegas (AGAL, MDL e ASPG-P) que compartilham igual conceção da língua comum e da Lusofonia. Desta forma, dava continuidade à posição galega a favor da unidade da língua, manifestada nos Acordos do Rio de Janeiro e Lisboa.
A sessão inaugural da Academia Galega da Língua Portuguesa teve lugar em 6 de outubro de 2008, em Santiago de Compostela. Desde então, mantém contacto frequente com instituições galegas e de fora da Galiza.
Na sede da Academia das Ciências de Lisboa, em 14 de abril de 2009, na altura do lançamento do Vocabulário Ortográfico da Academia Brasileira de Letras, o presidente da academia galega, José-Martinho Montero Santalha apresentou o Léxico da Galiza para ser integrado no Vocabulário Ortográfico Comum da Língua Portuguesa. Trata-se de uma escolha de vocábulos de uso corrente na língua oral ou na escrita literária, que ainda não estavam recolhidas nos dicionários da língua portuguesa. A responsabilidade deste trabalho correspondeu à Comissão de Lexicologia e Lexicografia, integrada por alguns dos mais conhecidos especialistas galegos. Montero Santalha, catedrático da Universidade de Vigo, reafirmava nessa altura a importância do Acordo Ortográfico como garante da unidade da língua escrita, que nos permite aos galegos a comunicação com mais de 220 milhões de pessoas. Como dizia o político e escritor Castelão, pai da Pátria Galega, em meados do século XX, a nossa língua é extensa e útil.
Em 5 de outubro de 2009 a Academia realizou em Santiago de Compostela o I Seminário de Lexicologia, com a participação dos académicos portugueses Adriano Moreira, Artur Anselmo e Malaca Casteleiro (da ACL), Maria de Lourdes Crispim e Maria Francisca Xavier (Universidade Nova de Lisboa), galegos (Álvaro Iriarte Sanromán, Isaac Estraviz e Martinho Montero Santalha) e o brasileiro Evanildo Cavalcante Bechara.
O Seminário de Lexicologia é um lugar de encontro que marca desenvolvimentos futuros num ambiente de cooperação e unidade. Foi neste evento que o professor Malaca Casteleiro apresentou o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa da Porto Editora, que integra o contributo lexical galego, mais de 800 palavras comuns na Galiza. Nessa altura, o professor Evanildo Bechara anunciou a inclusão, na próxima edição do Vocabulário da ABL, do contributo lexical da Galiza. Por sua vez, o académico Artur Anselmo, Presidente do Instituto de Lexicologia e Lexicografia da Academia das Ciências de Lisboa, comunicou que a terceira edição do Vocabulário da ACL incluirá também o léxico galego.
No breve espaço de vida da nossa instituição, assinamos em abril de 2009 um protocolo de Colaboração com os Colóquios Açorianos da Lusofonia, que acolheu e promoveu no seu seio o nascimento da nossa Academia, com a Sociedade de Geografia de Lisboa, e com a Universidade Aberta de Lisboa. Em aplicação do Acordo com esta última entidade, assinado em 5 de outubro de 2009, a UAb abrirá, durante este ano, o seu primeiro Centro Local de Aprendizagem fora de Portugal, na Galiza. A AGLP vai assinar também, em breve, um protocolo com o Real Gabinete Português de Leitura, com a Comissão Interpaíses Brasil-Portugal e Países de Língua Oficial Portuguesa, com a Associação Brasileira de Linguística, e com o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro.
Cabe indicar também que a Academia criou, em janeiro de 2009, uma Delegação no Brasil, sob a responsabilidade do professor Joám Evans Pim. O seu trabalho se verá continuado pelo Instituto Cultural Brasil-Galiza, criado sob os auspícios da AGLP, e que será lançado publicamente no dia 31 de março, em Florianópolis.
Exmas. Senhoras, Exmos. senhores: Vimos à Academia Brasileira de Letras com a maior vontade de colaboração. Na ocasião, apresento o terceiro número do Boletim da nossa academia, e a edição dos Cantares Galegos de Rosalia de Castro, adaptado ao Acordo Ortográfico, que constitui o primeiro volume da nossa Coleção de Clássicos da Galiza.
O professor Bechara participou nas palestras que organizou o grupo promotor da academia galega na Faculdade de Filologia da Universidade de Santiago, junto do professor Malaca Casteleiro, em outubro de 2007. Representou à Academia Brasileira de Letras na Sessão Inaugural da AGLP em 6 de outubro de 2008, como também no Seminário de Lexicologia realizado em 5 de outubro de 2009. Destarte anima, desde a primeira hora, o nascimento da nossa instituição, trazendo o apoio da centenária academia brasileira à mais jovem entre as academias da língua portuguesa. A AGLP quer render, desta forma, a sua homenagem ao intelectual e à figura humana deste brasileiro universal.
Não posso finalizar esta intervenção sem agradecer vivamente a oportunidade de me apresentar e representar a Galiza no Brasil. Uma Galiza moderna, renascida na melhor tradição cultural e cívica, na mais genuína tradição galega, a que nos leva à integração no espaço lusófono mantendo a nossa identidade linguística, o nosso léxico, as nossas pronúncias e a nossa literatura. Da nossa esquina atlântica vimos oferecer ao Brasil a nossa cooperação e o nosso compromisso de defesa da língua comum, na velha Gallaecia nascida.
Muito obrigada.